Colina vs. Alzheimer
No aeroporto de Frankfurt, na hora do embarque para São Paulo, baldeação inevitável e aborrecida para Colina, o colega poeta e neurocientista (Colinenses no. 1) se lembra de dizer-me que colina é fundamental para o bom funcionamento da mente. Sem colina não há memória, tudo se esquece e perde. Até o Alzheimer a persegue, perverso, eliminando os neurônios que a transformam de aminoácido em acetilcolina, a qual sustenta os registros do cérebro e de seus processos cognitivos, por conseguinte a própria inteligência.
Colina é uma fonte essencial de memória e inteligência!
Por alguma razão, nós, colinenses, nascemos aqui.
O colega é taxativo, em e-mail que me mandou depois:
“... colina é um aminoácido a partir do qual é produzido, pelo cérebro, o neurotransmissor acetilcolina, que é fundamental para os processos da memória. Sem acetilcolina, a memória fica muito prejudicada, o que acontece, por exemplo, na doença de Alzheimer, que provoca uma destruição maciça de neurônios produtores de acetilcolina (os neurônios colinérgicos)...”.
Tudo bem, tudo normal. Ele apenas mostra o que nós já sabíamos de sobra, por experiência própria: a inteligência vem de colina.
Mas em seguida ele descamba de vez, vindo pra cima de mim, ainda sob o impacto da mudança inesperada e incompreensível para a cidade natal:
“Se a colina é tão importante para a memória, o seu retorno a Colina não seria, então – e duplamente -, o reencontro com um passado perdido “prousteano”, o qual, em vez de sair de uma xícara de chá (como no caso de Proust), saísse de dentro das suas famosas botas de couro colinenses, as quais, por sua vez, à semelhança daquelas do Gato de Botas, pudessem conduzi-lo, por léguas e léguas afora, ao maravilhoso mundo da fantasia que é memória e da memória que é fantasia?”
O poeta-neurocientista- psicoterapeuta-diplomata apresenta essas palavras como um mote – uma provocação para que eu escreva mais uma crônica desta série.
Aceito o desafio, esta é a crônica!
Mas o desafio maior, acho, é entender o que ele diz, esquecendo o poeta sensível, transparente, e dando uma de psiquiatra esquivo e opaco, tentando pôr em compasso e contrapasso memória e fantasia, confundindo as quiméricas Botas do Gato com as botinas muito pedestres do Fernando Paçoca.
Diante dessas incongruências nada colinenses (isto é: nada inteligentes), devolvo o desafio: por que o poeta não põe em boas métrica e rima essa estória cabulosa, “prousteana”, do passado que sai da xícara (todo mundo sabe que ele sai das botas), da memória que é fantasia dela própria, sendo esta memória?
Que o poeta, cristalino e puro, deslinde o psicoterapeuta provocador e obscuro, cuja memória em geral explora mas teme a fantasia, e cuja fantasia vale muita vez como fuga, complacente, para a memória inoportuna, arrependida, repleta de remorso.
E o remorso, segundo o poeta,
“...são estradas de barro com muitas subidas
difíceis
E abafamentos em volta”.
Boa definição para o peso penitente que os psiquiatras têm de carregar, de ofício, o que os faz muitas vezes uns fantasistas escapistas, desmemoriados voluntários, descolinizados (para proteger-se).
Esperemos pelo poeta, Cláudio Guimarães dos Santos, do qual já ficaram tão esplêndidos, esclarecedores e colinizados versos na Colinenses no. 1 – e também, agora, esses aí em cima.
Só não vale o poeta pôr em questão a validade de sua tese de neurocientista, que comprova, cientificamente, acima de qualquer dúvida, a memória-inteligência superior de quem vive e elabora colina sem parar, dia a dia – nós, os colinenses.
Haja aminoácido!
Viva colina! Abaixo o Alzheimer!
P.S. - Quem quiser fortalecer sua condição de colinense pode procurar na web o nutriente colinérgico, à venda para aprimorar os processos mentais. As bulas são esclarecedoras e convincentes.
SOBRE O AUTOR:
Renato Prado Guimarães nasceu em Colina, Estado de São Paulo.Começou a carreira profissional como jornalista, nas “Folhas” e no “O Estado de S. Paulo”; paralelamente, formou-se na Faculdade de Direito da USP, no Largo de São Francisco.Diplomata desde 1963, foi Secretário de Embaixada em Bruxelas e Bogotá, Chefe do Escritório Comercial do Brasil nos EUA, Cônsul Geral ad interim em Nova York, Ministro-Conselheiro na Embaixada em Washington e Encarregado de Negócios junto aos EUA, ad ínterim.Promovido aEmbaixador em 1987, exerceu aquela função na Venezuela, no Uruguai e na Austrália (cumulativamente, também na Nova Zelândia e em Papua-Nova Guiné). Foi igualmente Cônsul-Geral do Brasil em Frankfurt, na Alemanha, e em Tóquio, no Japão.No Brasil, foi Chefe da Divisão de Programas de Promoção Comercial, porta-voz do Itamaraty na gestão Olavo Setúbal e Chefe do Gabinete do Ministro Abreu Sodré; fora de Brasília, foi Chefe do Escritório do Ministério das Relações Exteriores em São Paulo – ERESP, que instalou.Aposentou-se em abril de 2.008. Reside atualmente em Colina, sua terra natal, interior de São Paulo, Brasil.
É o autor de “Crônicas do Inesperado”, lançado em outubro de 2.009.
Para contatos, usar o endereço de e-mail rpguimar@gmail.com
Aberto às suas opiniões, sugestões, etc...
para saber mais sobre o autor, por favor, acesse os links:
http://colinaspaulo.blogspot.com.br/2012/04/renato-prato-guimaraes-autor-colinense.html
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