terça-feira, 22 de setembro de 2015

Colinenses nº 69 - crônica do Emb Renato Prado Guimarães


Calcanhar intrigante

De repente notei a mancha-verruga na parte superior do calcanhar: milímetro e meio de diâmetro, cor bem escura, para o preto, com reflexos avermelhados. Achei que era um carrapato, destes que infestam os cachorros colinenses, e apliquei-me o mesmo tratamento canino: pinça e um desinfetante qualquer.

Saiu a mancha, mas por pouco tempo: logo estava ela lá de volta, igual. Deixei pra lá, preguiçoso, mas minhas filhas não me permitiram esquecer: tem que ir ao médico, mostrar isso, pode ser coisa ruim.

Mostrei ao clínico, que não viu sinais malignos e aconselhou a não mexer, pois a lesão estava naquela pele elástica do calcanhar, que arreganha a cada passo; eventual corte seria difícil de cicatrizar.

As filhas não se conformaram com o parecer do generalista e exigiram segunda opinião - de especialista. Fui a uma dermatologista professora, de importante centro médico da região, a qual ignorou completamente o sinal, com displicente, magistral soberba. Fui a outro, no mesmo lugar, que admitiu não saber do que se tratava e prescreveu tratamento local, por creme, e pediu que voltasse em duas semanas. O que fiz, o sinal absolutamente inalterado, imune à terapia. Aí o segundo especialista disse que era necessário fazer uma cirurgia (!) para retirar a manchinha e submeter amostra a biópsia. Sua secretaria ajustaria tudo. Com efeito, dia seguinte a secretária me convoca para comparecer uma semana depois, em hora marcada, ao centro cirúrgico de hospital local.

Eu, hein? Da pinça ao bisturi, assim, sem mais...

Fui não, inventei um pretexto para adiar, deixei para depois – quando? Afinal, a saga do calcanhar já durava muitos meses. Mas persistiu meu remorso por não dar satisfação às preocupações de minhas meninas. Pedi indicação a amiga colinense, que me recomendou dermatologista com clínica em Barretos. Marquei hora, lá fui e exibi a marca intrigante, narrando os antecedentes de suajá alentada história médica.

Não precisei ir longe, pois ela olha e de imediato me interrompe com este diagnóstico achincalhante:

- Uai, mas isso parece bicho-do-pé!

E era. A “cirurgia” foi feita na hora, durou 3 minutos.

Diplomata,por ofício urbano, tardiamente empenhado no retorno às raízes rurais, não sei até hoje que sentimento me domina no episódio: constrangimento, vexame - ou vaidade, orgulho? Em lugar de sinal de atraso sanitário, o bicho-do-pé não é marca do regresso desejado e bem-sucedido?



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